Em lugar de avanços, a agenda dos direitos humanos no Brasil atingiu um estado crítico, com preocupantes retrocessos, agravados pela pandemia da Covid-19, aponta relatório coletivo de 30 organizações da sociedade civil brasileiras que monitoram o cumprimento das recomendações da ONU (Organização das Nações Unidas) no País. Em lançamento público ontem em live, foram apresentadas algumas das temáticas que mais apresentaram aprofundamento das violações de direitos humanos, como saúde, questões de gênero, povos indígenas e meio ambiente. O documento foi organizado pelo Instituto de Desenvolvimento e Direitos Humanos (IDDH) de Joinville, coordenado pela professora do curso de Direito da Univille Fernanda Brandão Lapa, com apoio do Friedrich-Ebert-Stiftung Brasil.

Segundo o documento - “Revisão Periódica Universal (RPU) dos Direitos Humanos no contexto da Covid-19” – das 190 recomendações avaliadas em 12 temáticas, apenas uma foi cumprida e 64 são consideradas em situação de retrocesso. Do total 47 são consideradas em parcial cumprimento. A maioria, 142, é considerada não cumprida. O relatório foi entregue ontem na plenária do Conselho Nacional de Direitos Humanos e atribui os retrocessos também à Emenda Constitucional nº. 95/2016 (que instituiu novo Regime Fiscal) e à “múltipla crise (sanitária, econômica, política, ética)” associada ao atual governo.

“O que fazer diante desse quadro de agravamento das violações de direitos humanos está no próprio relatório. A começar que as recomendações cumpridas e as parcialmente cumpridas têm quase na sua totalidade uma forte influência, uma forte atuação do Poder Judiciário, especialmente do Supremo Tribunal Federal, um caminho que não podemos perder. O relatório nos aponta uma falência dos equipamentos públicos”, enfatizou durante a live a ex-procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, também ex-presidente do CNDH (Comissão Nacional de Direitos Humanos). 

Duprat criticou a medida tomada no início do governo do presidente Jair Bolsonaro que revogou o dispositivo do PNDH3 que criava um comitê de monitoramento e fiscalização da implementação de direitos humanos no País. “Temos um esfacelamento de um estado que foi montado para cumprir o propósito constitucional. Temos um esfacelamento da participação social (...) servidores públicos treinados para se especializarem em temas da área vêm sendo perseguidos e os espaços de poder da administração pública federal sendo tomados por pessoas sem conhecimento da área e até contra os temas de direitos humanos”, acusou Duprat.

Compromissos internacionais

A Revisão Periódica Universal (RPU) é considerada o mecanismo mais inovador do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas (CDH). Determina que os 193 Estados-membros da ONU sejam submetidos periodicamente a uma revisão de sua situação de direitos humanos, a cada quatro anos e meio. Em 2020, em razão da pandemia do novo coronavírus, o Coletivo RPU Brasil optou por elaborar novo relatório.

De acordo com a Resolução 60/251 (2006) da Assembleia Geral e a Resolução 5/1 (2007) do Conselho de Direitos Humanos, a RPU visa avaliar o cumprimento por parte dos Estados das obrigações e compromissos internacionais assumidos em matéria de direitos humanos.