O local era frequentado pela comunidade LGBTI+ e era um dos únicos lugares onde a polícia não realizava abordagens violentas

O público em frente ao bar Stonewall Inn

Era uma manhã de sábado do dia 28/06/1969 quando gays, lésbicas, travestis e drag queens entraram em confronto com as forças policiais no bar Stonewall Inn, em Nova Iorque, Estados Unidos. A união do público LGBTI+ foi uma resposta às ações policiais autoritárias e humilhantes que aconteciam frequentemente em bares gays da cidade de Nova Iorque e durou seis dias. Essa união de forças ficou conhecida mundialmente como a Rebelião de Stonewall e marcou na história o dia 28 do mês de junho como uma data de luta internacional por direitos e pelo orgulho da comunidade LGBTI+.

Marsha P. Johnson e Sylvia Rivera

Marsha e Sylvia durante as manifestçãoes 

O episódio no Stonewall foi muito importante para que as pessoas transexuais conseguissem ter voz na sociedade, que insistia em marginalizar e negar as suas existências. Mas não foi apenas a sociedade que negligenciava a existência de transexuais e travestis, a própria comunidade LGBTI+ silenciava e discriminava os transexuais. Marsha P. Johnson e Sylvia Rivera foram as mulheres trans que aturam na linha de frente de Stonewall. As duas sempre estiveram ligadas aos direitos e acolhimento da população antes mesmo da rebelião em frente ao bar. Mas, em 1970, as duas conseguiram alugar uma casa e criar a STAR – Street Transvestite Action Revolutionares (na tradução livre: Ação das Travestis de Rua Revolucionárias) e auxiliar jovens trans e drag queens que viviam nas ruas de Greenwich Village.

Em 1992, aos 46 anos, o sorriso contagiante e alegria de Marsha foram apagados da cena LGBTI+. Seu corpo foi encontrado boiando no rio Hudson e a polícia sugeriu que se tratava de um caso de suicídio. Os amigos de Marsha contestaram versão por acreditarem que ela teria sido assinada e saíram pelas ruas de Nova Iorque exigindo justiça.  Muito tempo depois, em 2017, a ativista trans Victoria Cruz iniciou uma investigação por conta própria para apurar os fatos. A investigação resultou no documentário “A morte e vida de Marsha P Johnson” na plataforma Netflix.

O movimento LGBTI+ do Brasil começou a se desenvolver na década de 70, em meio a Ditadura Militar. Um momento onde acontecia um mesmo em um momento violento e marcado pela censura, as publicações alternativas como os jornais Lampião da Esquina e o ChanacomChana foram imprescindíveis para o desenvolvimento da movimentação da comunidade. Foi nesta época, da imprensa alternativa, que o Lampião iniciou as suas atividades após um abrandamento de anos de censura. Com uma tiragem de 10 a 15 mil exemplares, o jornal tinha o propósito de excluir a marginalização do gay, denunciar a violência contra o público LGBTQ+ e promover abertura dos discursos das minorias naquela época.  

No ano de 1981, um grupo de lésbicas fundou o ChacomChana, que reunia informações e as discussões femininas, principalmente dedicadas e direcionadas às lésbicas. O jornal era comercializado no Ferro’s Bar, região central da cidade de São Paulo, e muito frequentado por lésbicas e conhecido pelos encontros LGBTI+. Mas o dono do bar decidiu proibir a comercialização do periódico no local. A proibição foi marcada pela violência e a expulsão das mulheres do local. Foi no dia 19/08/1983 que lésbicas, feministas e ativistas LGBTI+ se reuniram em frente ao bar em forma de protesto, que resultou no fim da proibição da comercialização. O ato político ficou conhecido como o “Stonewall brasileiro” e, por isso, o dia 19 de agosto é comemorado o Dia do Orgulho Lésbico no Estado de São Paulo.

A REALIDADE BRASILEIRA

A união dos movimentos no passado foi importante para que a luta por igualdade continuasse na atualidade e que novos organizações surgissem. Ainda em resistência, os diversos movimentos da atualidade precisam permanecer em vigilância. Segundo a psicóloga e egressa da Univille, Alessandra de Sá, com muita resistência dos movimentos, o Brasil deu passos curtos nos aspectos LGBTI+. “Ainda temos um longo caminho a percorrer, principalmente no que se refere às violências sofridas pelas pessoas Transexuais e Travestis, que pode ser considerado o grupo mais marginalizado da população LGBT”, destaca.

A violência coloca o Brasil em um ranking que não gera orgulho algum ao país, sendo a nação mais violenta para a população LGBTI+. Em 2019, o Brasil contabilizou, segundo o Grupo Gay da Bahia (GGB), 329 mortes violentas de LGBT+ vítimas de homotransfobia. Deste total, foram 297 homicídios e 32 suicídios. No relatório do GGB, Santa Catarina teve seis casos de mortes.

Só no ano passado, foram 124 pessoas transsexuais mortas em todo território nacional, sendo 121 travestis e mulheres transexuais e 3 homens trans, segundo dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) em parceria com o Instituto Brasileiro de Trans de Educação (IBTE). A impunidade em relações aos crimes também continua ferindo a comunidade LGBT e os familiares, pois, de todos os casos, só 11 tiveram seus suspeitos identificados pela polícia. E no mesmo levantamento, outra estatística é que 67% das mortes foram contra travestis e mulheres transexuais profissionais do sexo, que são mais expostas à violência direta e reféns da marginalização estabelecida pela sociedade, seja pela falta de oportunidades e da ineficiência ou ausência políticas públicas.

“Especialmente no campo das Políticas Públicas LGBT, o Brasil realizou conquistas importantes como o Programa Brasil sem Homofobia, existente desde 2004, e a Política Nacional de Saúde Integral LGBT, criada em 2011, contudo, ambas as políticas demonstram problemas de efetividade, considerando problemas como: ausência de debates e estudos acerca desta temática nos cursos da área da saúde e educação, insuficiência de capacitações profissionais para trabalhar com o público LGBT, resistências pessoais dos profissionais, e em suma, o próprio conservadorismo do nosso país”, aponta a psicóloga Alessandra.

Na ausência do suporte das estruturas do governo, as ONGs e movimentos sociais realizam um trabalho nas pontas e têm uma voz ativa na sociedade e na política. Alessandra também destaca que o Conselho Federal de Psicologia realiza o posicionamento frequente ao respeito das demandas de gênero e sexualidade, orientando os profissionais na atuação e atendimento das pessoas LGBT. “Entretanto, a Psicologia ainda tem se demonstrado presa à modelos tradicionais de atuação, o que dificulta um avanço, por exemplo, no campo das Políticas Públicas, que exige modos de atuação que construam ações e projetos coletivos”, finaliza.

Um dos avanços no combate ao preconceito foi a criminalização da homofobia, aprovada em 2019. A pauta era uma das principais reivindicações dos movimentos LGBTI+ do Brasil e chegou até o Supremo Tribunal Federal em ações movidas pela Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transgêneros e Intersexos (ABGLT) e pelo Partido Popular Socialista (PPS), em 2012 e 2013, respectivamente.

ORGULHO

Mesmo em meio às dificuldades, o sentir orgulho é importante para novas construções, sejam pessoais e para toda comunidade LGBT. É o orgulho que move milhões de pessoas em Paradas Gays, atos e cenários políticos pelo Brasil. O orgulho é uma bandeira para ser erguida e usado para a garantia de direitos e políticas públicas de saúde, segurança e inclusão da população da sociedade. “Acredito que a melhor forma de manter o orgulho de quem se é, é sentir-se pertencido, reconhecido e valorizado, então, manter os laços de identificação com pessoas e grupos que nos acolham e nos respeitem, é fundamental. Afastar-se de discursos de ódio e opressão também é necessário para que a saúde mental e o bem-estar das pessoas LGBT se mantenham. Realizar leituras, assistir a documentários, filmes e séries e seguir a referências (artistas, estudiosos, influencers etc.) nas redes sociais, também é uma recomendação. Enfim, nós sentimos, existimos e resistimos frente ao preconceito, e isso já poderia ser considerado o suficiente para nos sentirmos orgulhosos de nós mesmos”, orgulha-se Alessandra.

Para a professora do curso de Psicologia da Univille, Mariana Datria Schulze, a chama do orgulho deve se manter mesmo naqueles momentos em que a comunidade passa por tantas adversidades e pela falta de olhar. “Por entender que mesmo sendo a contramão, sendo o que deve ser escondido, mentido, velado, negado, eu me orgulho. A comunidade LGBT é formada por quem conseguiu se encontrar nesse mar de repressão. Não sou LGBT, mas defendo a liberdade de qualquer pessoa querer ser aquilo que ela é. E vou lutar por isso sempre”, destacou.

É o orgulho que também movimenta as ideias no ambiente universitário e que possam auxiliar fora dele também. João Victor, egresso do curso de Design – Programação Visual, desenvolveu o seu Trabalho de Conclusão de Curso inspirado no movimento de designers com causas ativistas de 2018. A partir disso, João iniciou as suas pesquisas e percebeu que o design poderia ser uma ferramenta de auxílio e mudanças nas causas sociais, principalmente LGBTI+, por fazer parte da comunidade e estar envolvido no movimento.

O resultado surgiu em uma tipografia, caracterizada como display, para uso dos movimentos LGBTI+ para expressão, identidade e participação na comunicação de mensagens ativistas. Para o designer, a Universidade é o espaço onde acontecem as discussões construtivas e projetos de cunho social focados em como melhorar a vida de muitas comunidades. “Estudar toda a história do movimento LGBTI+ e reconhecer até onde chegamos, mas saber que ainda temos um longo caminho de luta por igualdade entre todos”, destacou.

Ele foi orientado pelos professores Haro Schulenburg e Isadora Dickie, que auxiliaram durante todo o processo e colaboram até hoje. Em uma parceria com o professor Haro, surgiu uma série de postagens com letterings e a tipografia criada (Queer as Font) com o intuito de abordar questões sociais e de celebrar a luta e orgulho da comunidade LGBTI+.

 

RESPEITO E APOIO

O estudante da Univille pode solicitar a inclusão de seu nome social em todos os documentos institucionais. A solicitação deve ser feita a Central de Atendimento Acadêmico (CAA), onde o estudante preenche um requerimento com seus dados para inclusão nos sistemas da Universidade. Além disso, a Univille disponibiliza canais para denúncias, apoio e suporte nos casos de discriminação e homofobia. Joinville - Campus Bom Retiro - Central de Relacionamento com o Estudante (47) 3461-9020 ou cre@univille.br; Unidade Centro - Secretaria da Unidade (47) 3431-0600 ou unidadecentro@univille.brCampus São Bento do Sul - Central de Atendimento ao Acadêmico (47) 3631-9120 ou secsbs@univille.br e Unidade São Francisco do Sul - Secretaria da Unidade - (47) 3442-2577 ou univille.sfs@univille.br;

Fotos: reprodução Revista Galileu/Internet